Em uma noite chuvosa, bebendo sozinho no quintal, tendo como companhia um bom livro e meus pensamentos, divaguei sobre a brevidade da vida. Em dias nublados e chuvosos, sempre sou acometido por esta áurea melancólica e nostálgica. Lembro-me, com maior intensidade, dos amigos que se foram.
Tiveram os seus sentimentos, seus amores, seus trabalhos, suas alegrias e desgraças etc. Meus finados estão, agora, salvos das agruras desta vida, mas, porém, estão alheios às maravilhas raras e parcas que ela, a vida, nos oferece aqui e acolá, como um suspiro para continuar adiante, não desistir.
Eu seguro um copo de cerveja em minha mão, sentindo o líquido gelado descer pela minha garganta. A bebida parecia anestesiar meus sentidos, mas não conseguia apagar a sensação de melancolia que me envolvia.
Refletir sobre a morte nos faz valorizar um pouco a nossa existência, posto que o existir é demasiado efêmero; daí a valoração devida para o que somos: tempo. Somos com a chuva: esvaímos, invariavelmente, pela vala da vida. Encontraremos, todos nós, o fim inevitável, sabemos, mesmo não concebendo bem a questão da finitude, essa amarga verdade fatal.
Muitos filósofos, como Sêneca e Platão, por exemplo, bem como inúmeros outros, falaram e refletiram sobre, mas não tenho por pretensão filosofar sobre a morte, apenas refletir despretensiosamente, pois não é a didática, aqui, o que procuro, mas apenas beber, olhar para a chuva e pensar na morte dos meus enquanto escrevo.
Em tempos chuvosos, a melancolia se faz intensa, a saudade, também. Celebro a vida, paradoxalmente, quando penso no fenecimento, pois é aí que se faz refletir e considerar a vida como uma dádiva de Deus, um privilégio que muitos sequer tiveram a possibilidade de gozar por muito tempo.
Eu olho para a chuva, e vejo nela uma metáfora para a vida. As gotas caem, uma a uma, sem parar. Cada uma delas é única, e logo desaparece. É como se a vida fosse uma série de momentos, cada um deles precioso e efêmero. Eu penso em todas as pessoas que eu perdi. Em todas as coisas que eu fiz e que agora são apenas memórias. E eu me pergunto: o que é que eu vou deixar para trás? O que é que eu vou lembrar?
A chuva parou de cair, e a noite ficou silenciosa. Eu me levantei e fui para dentro da casa, sentindo que a morte estava mais perto do que nunca. Mas também sentindo que a vida era mais preciosa do que nunca. Ah, ainda há mais duas cervejas na geladeira, atrás do pacote com frango. Além de velho, estou ficando esquecido!
Tempos chuvosos, noite escura. Como é bom estar vivo… ainda. A chuva recomeçou!
Cauby Fernandes é contista, cronista, desenhista e acadêmico de História
0 comentários