Reza a lenda que durante o final da década de 1980 e meados da década de 1990, muitos He-Man brasileiros percorreram os rincões do país. O personagem do desenho fazia sucesso entre a criançada.
Desses prováveis imitadores só chegou até nós a história do He-Man nordestino. Seu verdadeiro nome? Lenine Alves Baptista. Lenine era, na verdade, oriundo do Paraguai, filho de mãe índia paraguaia e pai cigano russo. Sua passagem pelo Nordeste causou espécie.
Ainda hoje podemos encontrar vídeos na internet de suas façanhas e proezas. A mais famosa ocorreu em 1996, em Crato, região do Cariri, quando He-Man derrotou 35 homens ao mesmo tempo. Mas antes é preciso situar, sobretudo o leitor jovem, acerca da ritualística do circo em geral, e do circo dirigido por He-Man, em particular.
Quando o circo chegava, toda a cidade ficava em polvorosa. As crianças saíam à rua para ver palhaços, mágicos, animais adestrados, acrobatas. Havia riso e alarido por todos os lados.
Era o circo! As mulheres ficavam curiosas e espiavam pelas janelas. Até os homens davam um sorriso de canto de boca. Naquela época não havia internet, e até a televisão era um luxo de poucos.
Eu me recordo, por exemplo, que na minha rua somente uma casa possuía TV. No final do jornal eu corria em direção à casa da vizinha para ver o desenho. Era das poucas diversões que tínhamos.
Eu era louco por circos. Meu avô paterno era dono de um circo. Da primeira e última vez que ele, Machadinho, meu avô, foi à nossa cidade não paguei ingresso. Foi uma felicidade que só criança entende.
Mas as atrações do circo do He-Man eram ainda mais interessantes. Além dos prazeres do circo em si, ele, o “louro do nordeste”, ia para o centro da cidade, geralmente numa praça, e fazia demonstrações de sua força, desafiando os homens do local. Eu imagino como esses homens sentiam sua virilidade ameaçada.
Conta-se, mas isso não passa de boatos, que He-Man também era um talarico de mão cheia, por assim dizer. Daí por que os homens, diz-se, não permitiam que as mulheres fossem ao circo dele.
Foi justamente desta lenda urbana que surgiu a narrativa de que ele teria sido morto, nos idos de 2008, por um marido traído. Mentira. Ele foi morto pelo próprio sogro, por este não aceitar o rompimento de He-Man com a filha. Este fato, porém, não interessa ao cronista.
Na batalha do Crato nasceu a lenda. Eu contava com apenas dez anos e não sabia que existia um herói nordestino, um lutador de vale-tudo destemido, distribuindo tapas nas caras dos homens caririenses. Mas imagino o olhar das crianças que assistiam a ele, entre o espanto e a admiração.
He-Man era generoso com lutadores não profissionais. Um verdadeiro samurai. Não batia com a mão fechada, para não machucar muito seus oponentes. Batia com a mão aberta, o que, segundo Nelson Rodrigues, era pior – ” O problema do tapa não é o tapa, é o barulho”.
Fico imaginando o grito da criançada e o horror da plateia ao ver uma turba de homens sendo derrotados por apenas um, ainda que este fosse um He-Man. A incredulidade dos que não foram: “Só acredito se ele me tapear”, bem poderiam dizer os tomés de então.
É verdade que nem sempre ele vencia. Em uma ocasião que enfrentou vários lutadores profissionais, perdeu e teve de ser levado às pressas ao hospital. Conta-se que, mesmo ferido, He-Man não aceitou anestesia. Uma lenda!
Marcos Alexandre: Pai de Edgar, leitor, Professor de literatura e redação, cinéfilo e aspirante a escritor.
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