Num dia como o de hoje!

28/03/2024

Kleyton Bandeira Cantor, compositor e pesquisador cultural

Kleyton Bandeira
Cantor, compositor e pesquisador cultural

Era sexta-feira da paixão do ano de 1973, quando Gilberto Gil, alimentando-se do vinho da esperança, tem a ideia de escrever algo sobre o cálice do Sangue do Homem (que, talvez, representasse ali, naquele momento, um copo de requeijão).

Ele tem outra brilhante ideia: a de ligar para Chico Buarque e lhe perguntar o que ele achava e se ele se interessaria em compor, com ele, uma canção sobre o tema.

Chico, na mesma hora, aceita a parceria e o convida para se encontrarem no outro dia, sábado de aleluia, em seu apartamento, no Bairro da Lagoa, no Rio de Janeiro.

No outro dia, num dia como o de hoje, lá estava Gil, naquela cobertura de onde se descortinava a Lagoa Rodrigo de Freitas (esse silêncio todo me atordoa, atordoado eu permaneço atento na arquibancada para a qualquer momento ver emergir o monstro da lagoa).

Então Chico coloca uma mesinha na varanda e, para molhar as palavras, oferece uma bebida a Gil.

O aperitivo era Fernet, uma bebida alcoólica bastante amarga (como beber dessa bebida amarga, tragar a dor, engolir a labuta. Mesmo calada a boca, resta o peito; silêncio na cidade não se escuta).

Depois das preliminares, então, Gil pergunta:

– E aí, a ideia do cálice? Chico responde:

– Existe o cálice do sangue de Jesus e o cale-se do verbo calar que representa toda a dor e a opressão causadas ao povo pelo regime militar.

Começaram-se os rascunhos e, diante da ideia bastante densa da canção, a melodia não poderia deixar de ser marcante dentro de sua concepção lamuriosa.

Cálice, então, estava pronta para ser gravada.

Óbvio que não foi.

Gil e Chico, então, tentaram cantar Cálice no Festival Phono, no mesmo ano, em São Paulo, mas não conseguiram. O som foi cortado.

A música estava definitivamente censurada e só foi gravada cinco anos mais tarde, em 1978, por Chico Buarque e Milton Nascimento.

Gil afirma que nunca conseguiu lidar muito bem, e ainda não consegue, com Cálice devido ao sentimento de dor e tormento que a música carrega. Ele confessa, ainda, que nunca compreendeu de fato a figura do Pai dentro de uma transitoriedade entre a primeira pessoa da santíssima Trindade e o pai que assalta a individualidade do filho, no caso o Estado autoritário.

Você conhecia a verdadeira história que há por trás da canção Cálice?

Bom final de semana e um ótimo sábado de aleluia!

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