Os intragáveis

12/08/2023

Santiago Mello, humorista brasiliense, certa feita, em um dos seus shows, disse algo como ‘‘Esse negócio de cuidar da saúde, é frescura. É coisa de quem não apanhou quando era pequeno.’’ Como a nossa contemporaneidade emburreceu a ponto de não saber mais diferenciar um conteúdo humorístico (você gostando ou não) de uma declaração pessoal preconceituosa, temos que repetir o óbvio ululante: é uma piada!

No campo do humor negro, a mencionada anedota do Santiago nem chega a ser uma piada pesada! Léo Lins, excelente humorista carioca, exímio profissional neste segmento humorístico, é quem tem, a meu ver, o melhor repertório nesse quesito. Ele é um dos poucos humoristas que não se sujeitaram à patrulha do politicamente correto.

Aliás, é perseguido justamente por não ceder aos mimados e ressentidos, ou, como diria o filósofo pernambucano Luiz Felipe Pondé: aos ‘‘inteligentinhos’’ (pessoas que ele considera superficiais em seu entendimento e aplicação da inteligência. Trata-se de uma crítica à cultura da superficialidade intelectual e do pensamento simplista).

Pra piorar, preclaro leitor, há subgrupos igualmente chatos nesse meio. Veganos, por exemplo, de um modo geral, querem empurrar ‘‘mato’’ goela abaixo nas pessoas, porque um dia, como que por mágica, acordaram com uma consciência de preservação da vida animal e uma alimentação naturalmente saudável. Daí fazem protestos contra os carnívoros! Há gente mais insuportável?

E o que dizer dos grupos ‘‘geração saúde’’? Comecei relatando sobre eles. Pois bem. A pessoa que cuida, de um modo excessivo, da saúde, parece conceber a ideia de que não existe vida para além dos halteres, supinos e cia. O mundo do ‘‘No pain no gain’’ e suas patéticas fotos enquanto na frente do espelho da academia, bem como a máxima igualmente patética frase ‘‘Tá pago!’’, faz-me crer que nada me faria entrar em semelhante ambiente sofrível.

Não deixemos de lado os igualmente chatos espiritualistas. Nesse quesito, o leque é extenso: vai desde o ortodoxo cristão pentecostal ao crente em signos, energias, destino e demais misticismos. O problema do ‘‘grupo da fé’’, é que eles nos leem pela métrica limitada do mundinho que eles criaram, e geralmente tiram a responsabilidade deles da reta. Se algo não deu certo, é porque ‘‘o inimigo’’ está à espreita; se algo deu errado, foi o alinhamento de ‘‘x’’ e ‘‘y’’ planeta que interferiram na sua importantíssima vida – sim, o universo está demasiadamente preocupado com o ‘‘semideus’’ homem.

Mas não adianta correr na direção oposta: ateus são, em sua maioria, igualmente chatos com sua incansável missão de mostrar ao mundo que ele é o ‘‘diferentão’’:  o cara que não acredita em Deus! (grande coisa). Como o amigo leitor pode ver, a lista dos intragáveis parece não ter fim, não é mesmo? E talvez não tenha posto que as coisas, com o passar do tempo, só pioram.

 

 

Cauby Fernandes é contista, cronista, desenhista e acadêmico de História

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